Journal Potuguese Release - February 2024 - Flipbook - Page 69
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(re)encontro afetivo para trocas de acontecimentos e ancoragem das mudanças.
Uma observação de Aurora indicava um novo posicionamento: “Lá em casa está
como aqui. A gente se desentende bastante, mas logo nos acalmamos. O
Fantasma da Ira foi embora e resolver as reclamações está mais fácil.” Em meio a
tantas complexidades, ao deixarmo-nos tocar pelo inesperado e com abertura
para o acaso, adquirimos olhos para ver e encanto para enxergar.
Os bons fantasmas passaram a ser os parceiros nas negociações familiares,
conselheiros cuidadosos para novas decisões dos pais sobre a vida dos filhos. E
assim nos despedimos, embora sabendo que um novo fantasma estava prestes a
chegar; era amarelo e sua especialidade seria reclamar por aí: “Tudo eu, Porquê
sempre eu??...”. Pensando na natureza dialógica do brincar como ferramenta
conversacional com crianças, Bakhtin (1986) aponta para a possibilidade de criar
algo absolutamente novo, a partir do que é dado. O que é dado é totalmente
transformado naquilo que é criado e essa transformação pode ser formidável...
Palavras Finais
Segundo Grandesso (2000), a principal diferença do uso de questões em terapia
narrativa é que elas são feitas para gerar experiência ao invés de obter
informação. A autora cita Freedman e Combs (1996) ao dizerem que “quando
geram experiência sobre realidades preferidas, as questões podem ser
terapêuticas em si mesmas” (p. 113). Assim, a partir da abertura curiosa para
conhecer cada fantasma, deixamo-nos conduzir, adultos e crianças, tanto nas
sessões presenciais quanto nos contatos virtuais, pela criatividade e confiança
mútuas.
O leitor pode perguntar-se a respeito da menor participação de Leo, o filho
caçula, e da quase ausência do pai, nas sessões familiares. Como não há um
planejamento prévio sobre como se dará o processo terapêutico, mas o trajeto se
constrói ao caminhar, as escolhas levaram em conta as dificuldades apontadas
por Aurora e apoiadas por Daniel, especialistas das próprias vidas, desejos e
esperanças (Anderson & Goolishian, 1992). As mudanças de Daniel contribuíram
para minimizar os stresses domésticos com o irmão, uma conquista almejada por
Aurora. Realizamos também algumas sessões com o casal, para que pudessem
dialogar sobre as adversidades e obstáculos enfrentados por cada um, para assim,
poderem apoiar-se mutuamente como o sistema protetor que esperavam ser.
Os Maus e os Bons Fantasmas: Uma História de Reautoria em Terapia Narrativa com Criança
Journal of Contemporary Narrative Therapy, February 2024 Release, www.journalnft.com, p. 4770.